
E torno a deixar, muito lentamente, que este ar entre, por muito que a dor que volta e que nunca partiu me apanhe de surpresa e me aperte a garganta. Se eu não respirar, quem vai respirar por mim? Mas há veneno no ar. Cada vez é mais difícil inspirar. Eu tento, e tento tanto, mas vou ficando cada vez mais tonta, a minha visão turva. Há um túnel difuso que se estende à minha frente onde escolho entrar. Tudo é baço e a dor pulsa com vida nova. Já não é negro o que a dor irradia até me cercar. É a cegueira branca que me apanha. Branco. Só vejo o branco de toda uma memória do que podia ter sido mas que, rapidamente, se apaga. O ar aqui é rarefeito, já não cabe no meu peito. A memória do futuro que tinha escolhido avança a passos largos pelo túnel difuso e eu estou demasiado fraca para a alcançar, não consigo tão-pouco esticar o braço para a agarrar... Só o branco fica, a cegueira branca da dor que prospera. Deixo muito lentamente que o ar encha o meu peito mas alguém me devia ter dito que ele estava envenenado e que, tudo o que consegui engolir com tanto esforço, não foi mais do que o ver-me evaporar neste vazio baço do meu futuro que se perdeu.
Imagem: "Bathtub" de Brock Davis, http://itistheworldthatmadeyousmall.com.
1 comentário:
Para ti
http://defenderoquadrado.blogs.sapo.pt/548440.html
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